Prefácio O "conhece-te a ti mesmo" dos antigos é um princípio de profunda sabedoria. Estabelecendo-nos na verdade, e, portanto, na verdadeira humildade, põe-nos nas melhores condições para um bom relacionamento com os outros, e para a aceitação dos muitos "eus" que nos cercam, cada um dos quais é intrinsecamente e constitucionalmente diferente do "meu eu", por maior intimidade que haja entre as pessoas.
Ensina-nos, sobretudo, a aceitar-nos como somos, e a construir sobre esse material bruto a obra-prima que cada homem é chamado a ser, no reino de Deus. Esse material, o nosso, que não é igual a nenhum outro, embora composto de muitos elementos idênticos, é o resultado de muitos fatores: hereditariedade, educação, circunstâncias de vida (mormente nos primeiros anos), fisiologia, qualidades naturais, ambiente, etc, etc. Mas é aperfeiçoável, e não irreversível.
O conhecer-se a si mesmo é uma arte e uma graça. Ninguém se conhece perfeitamente. Para isso, seria preciso ver-se como o próximo o vê, e isso apenas lhe daria um conhecimento imperfeito, pois que o "outro" nunca está em condições de julgar. Seria preciso, antes, ver-se como Deus o vê. Só ele sabe "o que há no homem" (Jo 2.25); só ele pode dar o devido valor, o devido mérito, a devida desculpa ou a devida condenação, a cada pensamento e ato humano. Por isso, digo que é uma graça o conhecer-se, graça que se obtém pela oração, e pelo empenho, a análise, a observação e o exercício essenciais à aquisição de qualquer arte. Obtém-se, principalmente, pelo auxilio do Divino Espírito.
Esse conhecimento, dando-nos o porquê de muita coisa que se passa em nós, é um poderoso agente da nossa saúde mental, espiritual e física. A compreensão, a aceitação, — ou a não-aceitação, no caso da necessária metânoia ou conversão, do esforço para cura interna, enquanto depende de nós, — essa compreensão, digo, é meio caminho andado para o equilíbrio interior e para a perfeição integral do homem: mens sana in corpore sano. Essa máxima, que se banalizou, exprime uma realidade que não podemos salientar por demais: a inter-relação e mútua influência do composto humano, espírito-corpo, entendendo por espírito a alma e a mente, que fazem dele animal racional.
Este livro nos lembra, de maneira cativante e sábia, que todos os temperamentos têm um lado maravilhoso de qualidades e tendências especiais, como de dificuldades a serem superadas, nas fraquezas que lhes são peculiares. Nenhum temperamento, aliás, exclui completamente traços dos outros. Trata-se apenas de predominância.
Há, porém, um fator comum a todos: o medo. Hoje, reconhece-se o lugar que o medo tem na maioria das nossas reações conscientes ou inconscientes, que criam problemas, ou agravam os problemas já existentes.
Outro fator é o desamor, e por isso se entende toda a escala de atitudes internas ou externas, que são o fruto do antagonismo, da mal querência, ou do nosso sentimento de superioridade, — orgulho, soberba —, em relação a Deus ou ao próximo.
Para esses males, e são esses os verdadeiros males, o antídoto é-nos indicado por Paulo, em Gálatas 5.22-23: "O fruto do Espírito é amor, alegria, paz, paciência, delicadeza, bondade, confiança, mansidão, temperança. Contra essas coisas não há lei". Esses frutos do Espírito, que o Apóstolo aponta como um só, o fruto, são o fogo que queima e lava todos os males, fazendo de nós novas criaturas: "Se alguém está em Cristo, é uma nova criatura" (2 Co 5.17); criaturas não-condicionadas a circunstâncias, a antecedentes, a impulsos incontroláveis, mas libertas, pela ação onipotente do Santificador. "Onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade." (2 Co 3.17)
Com ele, resolvem-se todos os problemas, ou, se não se resolvem, transforma-se o estado de espírito, e o que era problema deixa de o ser. Nos desígnios eternos de Deus, os determinados problemas têm uma finalidade construtora, muito além da nossa compreensão. "Sabemos que todas as coisas concorrem para o bem dos que amam a Deus." (Rm 8.28)
Este livro ensinará a muitos como encontrar a felicidade e a saúde na entrega total e incondicional à ação do Espírito Santo, para que seja ele a controlar o nosso temperamento. O melhor modo de secundar essa ação é não lhe opor obstáculos.
Não duvido que o livro seja uma bênção e um semáforo orientador e seguro para tantas pessoas que buscam a paz, mas se debatem ainda com o medo e o desamor, e, não se conhecendo, perdem-se, refletindo-se em outros, e deixando-se influenciar pelos reflexos dos outros em si. O Confortador divino nos ensinará nós mesmos, e será a nossa luz e forca para atingirmos o máximo da nossa capacidade humano-divina, com o temperamento que é o nosso.
Assim desejo e assim lhe peço, para que mais e mais, em nós e em tudo, Deus seja glorificado.
Haroldo J. Rahm, S.J
TEXTO EXTRAÍDO DO LIVRO: Temperamentos Controlados Pelo Espirito
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Faça comentários produtivos no amor de Cristo com a finalidade de trazer o debate para achar a verdade. Evite palavras de baixo calão, fora do assunto ou meras propagandas de outros blogs ou sites.