Quando jovem (e não faz muito tempo assim...), tolamente dizia “preferir uma dor aguda a uma dor crônica”. Deixe-me explicar.
Por dor aguda refiro-me ao sofrimento intenso, porém curto, como um apendicite ou cólica renal, típicos de dores agudas e intensas, que quase enlouquecem, mas que se diagnosticados corretamente, realiza-se o procedimento adequado e logo vem a recuperação. A dor passa e chega-se à normalidade.
Por dor crônica, refiro-me àquela sensação prolongada, que vai se arrastando dia, meses e anos, sem solução. Eventualmente não é uma dor intensa, mas se parece com uma leve artrite, uma dor muscular, que dura longos períodos, e sempre aparece para lembrar que ainda está presente. Eu tenho uma dor na perna esquerda que já dura quase 3 anos. O médico não conseguiu dar um diagnóstico, o raio X nada revelou, e confesso que não fiz nenhum esforço maior para aprofundar os exames médicos e descobrir o que está acontecendo, e como a dor é pequena, embora incômoda, acho que inconscientemente desisti de buscar a solução e preferi me adaptar. Complicado, não?
Com a idade, entretanto, cheguei à conclusão de que não gosto de dor de jeito nenhum. Toda enfermidade gera enorme senso de impotência e ficar doente revela toda arrogância e independência humana. Depender dos outros, perceber que o corpo não se dispõe a agir, prostrar-se numa cama ou num leito de hospital é sempre uma experiência desencorajadora. A dor, seja ela crônica ou aguda, desestrutura, ainda que nem sempre, a dor seja ruim. A ausência da dor em alguns casos, pode ser devastadora. Uma das doenças mais horríveis da história humana, a hanseníase, leva o ser humano à perda da sensibilidade de seus axônios deixando-o vulnerável e colocando-o em risco, exatamente por não sentir dor.
A verdade é que a dor sempre traz desequilíbrio, entretanto, dores prolongadas causam enorme impacto na vida, sejam tais dores físicas ou emocionais. Tenho acompanhado relacionamentos doentios, sustentados por provocações mútuas, as feridas vão se perpetuando e gerando novas mazelas. Um emprego que rouba a criatividade, um casamento no qual os cônjuges decidem se tornar inimigos e complicar a vida do outro, um negócio mal resolvido que dura uma eternidade. Meu amigo Neander Coelho diz que “é melhor um fim pavoroso do que um pavor sem fim”.
Ninguém pode se manter saudável em longos processos patológicos. Algumas pessoas se tornam um lixo nestes processos mal resolvidos. É comum vermos pessoas tentando sustentar um casamento que já acabou dez anos atrás, e durante este tempo as feridas só vão aumentando porque nenhuma das partes faz concessões, ou resolve quebrar o ciclo do mal, e neste processo de raiva e mágoa, incapazes de perdoar, tentam manter a aparência sem um adequado desfecho da situação.
Certamente a dor nunca é desejável, mas é necessário virar a página do ódio, acusação e culpa para se buscar uma alternativa à vida e à celebração.
Rev. Samuel Vieira
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